quarta-feira, 26 de março de 2014

Shopping Center: Sintoma de uma Cidade Doente

  Atualmente vêm sendo inaugurados vários shoppings centers na cidade de Salvador, e há quem ache que isso é sinônimo de desenvolvimento. Porém, o que isso reflete na realidade, é o total estado de decadência dos nossos espaços públicos.  Quando o shopping passa a ser uma necessidade e não apenas mais uma opção, isso é sinal de que a cidade se encontra terrivelmente adoecida.
Quando o engarrafamento é sufocante e não encontramos estacionamentos tão facilmente, quando as ruas não são agradáveis aos sentidos (ruas feias, fétidas, com poluição sonora e visual), quando há uma constante sensação de insegurança, quando a infraestrutura das ruas é decadente, as calçadas quebradas e você tem que disputar o espaço com carros e camelôs, obviamente a melhor solução é nos refugiar em um ambiente mais agradável e de fácil acesso como um shopping center, para fazer nossas compras e satisfazer nossas necessidades de lazer.
Fatores que causam desconforto em locais públicos:
- Psicológico – Medo da violência, que gera uma reação de alerta constante que faz o corpo produzir hormônios do estresse (adrenalina e cortisol).
- Visual – Ruas feias, esburacadas, mal organizadas, prédios sem manutenção.
- Olfativo – Ruas fétidas.
- Tátil – Calçadas quebradas. Lugares sujos.
- Térmico – Problema que poderia ser resolvido com paisagismo adequado e implementação de soluções tecnológicas. Além disso, a alta densidade de pessoas e carros contribui com esse fator.
- Proxêmico – O ser humano, de um modo geral, apresenta necessidades proxêmicas específicas, isto é, a necessidade de manter certa distância de outras pessoas e de objetos. Essa distância é como uma extensão do corpo físico e funciona como uma barreira invisível. Violar esse espaço mínimo necessário, causa desconforto e estresse no indivíduo.
Quando o poder público é incapaz de solucionar os aspectos de qualidade dos espaços públicos, os shoppings centers aparecem como soluções para supri-los e remendar essa grande falha de mercado. Esse modelo de empreendimento é uma solução imediatista para locais subdesenvolvidos.
Cidades que dão certo, que nos encantam e são reconhecidas por seu charme, tem sempre um fator em comum: a vida intensa ocorrendo nas ruas. Uma cidade viva é uma cidade fluida, com lugares estratégicos para o livre trânsito e convivência de pedestres, cujo comércio não precisa se refugiar em cápsulas privadas. Nessas cidades, é comum encontrarmos calçadões e vielas para trânsito exclusivo de pedestres, com lojas, bares, cafés, cinemas e restaurantes ao ar livre. É o caso de vários locais em Nova Iorque, Bruxelas, Paris, ou até mesmo a Zona Sul carioca, que é, inclusive, a área mais valorizada do Brasil. Nesses lugares, torna-se desnecessário o modelo de shopping enclausurado, por que é na rua que tudo acontece. O Pelourinho, é um dos pouquíssimos lugares atrativos em Salvador, por ainda ter um pouco dessa característica de vivacidade, embora esteja ilhado em uma zona altamente perigosa da cidade.
Como exemplo de projetos interessantes de requalificação de espaços públicos, podemos citar o caso da via comercial Vidal Ramos no centro histórico de Florianópolis, em que foi feita a revitalização das fachadas, da pavimentação e implementação de iluminação adequada e de mobiliário urbano – bancos, lixeiras, floreiras e tótens. A medida valorizou o cenário, diminuiu a ociosidade da região aumentando o número de pedestres e vitalizou a área.
Quanto mais shoppings são construídos, menos investimentos são feitos para uma reforma urbana, que melhore o fluxo, infraestrutura e o transporte público. Quando um shopping é construído, cria-se uma zona de concentração de pessoas em determinado local, enquanto outras áreas da cidade se tornam ociosas. Essas áreas ociosas, tornam a cidade morta, estéril, além de se tornarem redutos de violência.  Precisamos pensar nas ruas como locais de convivência em comum e não como mero espaço de passagem de carros. A rua é o espaço de todos, e não de ninguém.